terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Depoimento




O desabafo de Teresa Cruvinel




De Teresa Cruvinel, publicado no Correio Brasiliense

Neste último artigo do ano aqui no Correio, não tenho como não falar dos oito anos trepidantes, em todos os sentidos, que estão chegando ao fim. Os anos Lula não apenas mudaram para sempre o Brasil. Mudaram também nossa forma de sentir e pensar nosso país.
Sob Lula, aprendemos a enxergar a pobreza, a importância de combatê-la e, mais recentemente, a celebrar sua redução.
Vimos um presidente chegar ao poder contrariando tudo o que sempre nos pareceu natural: sem berço, sem diplomas, sem o apoio das elites econômicas e pensantes. Vimo-lo, depois, quebrar todas as convenções ao exercer o poder: falando a linguagem desabrida do povo, cometendo metáforas rasas e gafes frequentes, quebrando a liturgia do cargo, trocando o serviço à francesa do Itamaraty por um buffet self-service, tomando café com os catadores de papel e exercitando uma aguerrida diplomacia presidencial sem falar outra língua.
Não haverá outro Lula, pois o Brasil que o gerou não haverá mais. E isso é bom.
Neste período, 28 milhões de brasileiros cruzaram a linha da pobreza e outros 20 milhões ascenderam à classe C. Mais extraordinário é que esse feito tenha acontecido sem a quebra de um só cristal. Ou seja, Lula não tomou uma só agulha dos mais ricos para dar aos mais pobres. Não privou os banqueiros de seus lucros para estender o crédito ao andar de baixo. Não reduziu as exportações do agrobusiness para dar mais comida ao povo. Não garfou a poupança da classe média para criar o Bolsa Família. Tudo fez harmonizando interesses e moderando conflitos. Todos ganharam, embora os mais pobres tenham começado a tirar a diferença.
Em 2009, apesar da crise, a renda média dos 40% mais pobres cresceu 3,15% e dos 10% mais ricos apenas 1,09%. E isso é bom para todos, inclusive para os ricos. Este ano, os números serão mais eloquentes.
O crescimento da economia, que pode chegar aos 8% em 2010, será o maior em 24 anos. Desta vez foi crescimento sem inflação e com distribuição de renda. No final do período Lula, terão sido gerados 15 milhões de empregos. Este ano, a nova classe C vai gastar R$ 500 bilhões em 2010, superando o consumo das classes A e B. Isso é mudança.
Sob Lula, a percepção do Brasil mudou também lá fora. Agora o país é player, é líder no G-20, é um dos Brics, vai sediar a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016. Vamos perdendo o velho complexo de vira-latas.
Nem tudo foi resolvido, nem tudo foi feito e não faltaram as decepções. Sobretudo as políticas, com os casos de corrupção intermitentes. Mas o saldo a favor de Lula foi bem maior e levou-o ao píncaro da popularidade. Mesmo assim, ele continua sendo um presidente intragável para uma minoria. Talvez para aqueles 4% ou 5% que, nas pesquisas frequentes, consideram seu governo péssimo, contra os 80% que o consideram ótimo ou bom.
As relações com a mídia serão um capítulo na história a ser escrita. Vivi a minha pequena parte. Colunista política de O Globo, nunca apontei, nos seis governos e sete legislaturas que cobri, apenas o bem ou o mal. Assim erigi minha credibilidade de analista político. A partir de 2003, divergi do pensamento único que passou a vigir na mídia, não engrossando a cruzada anti-Lula. Na elite do jornalismo político, muito poucos, além de mim e de Franklin Martins, fugiram ao padrão monopólico e demonizador.
Houve preço. Em 2005, veio o maccarthismo e com ele os cães raivosos e o espírito de delação. Um deles espumou, em 2005, que Lula só não caíra ainda porque uma lista de jornalistas lulistas, aberta com meu nome, havia aparelhado a imprensa! Por algum tempo sustentei o apedrejamento, mas, já tendo sofrido uma ditadura, rejeitei a escolha entre autoimolação e sujeição.
No final de 2007, aceitei o convite para dirigir a TV Pública que seria criada, cumprindo a Constituição Federal. Pouco vi o presidente depois disso. Tenho trabalhado com absoluta liberdade e os resultados estão aí. Nunca recebi queixas ou bilhetinhos de ministros.
Não tenho a menor importância na história maior que se encerra agora. Conto isso aqui porque esses detalhes fazem parte do ambiente venenoso, eivado de intolerância, elitismo e ódio de classe em que Lula governou e construiu o legado que deixa ao país.

sábado, 4 de dezembro de 2010

O blecaute de 2009 e o apagão de 2001/2002

Dois problemas absolutamente distintos de fornecimento de energia elétrica durante os governos FHC e Lula tiveram tratamentos absurdos na grande imprensa brasileira. O racionamento de energia do governo tucano ocorreu entre junho de 2001 e fevereiro de 2002, com duração de cerca de nove meses; o blecaute durante o governo petista (2009) durou cerca de oito horas.

Matérias do jornal Folha de São Paulo sobre o longo racionamento de energia tucano e sobre a falta episódica de luz de algumas horas durante o governo do PT revelam uma postura inexplicável da imprensa diante desses fatos tão distintos, tratados como se fossem a mesma coisa.

A bem da verdade, vale notar que a Folha foi o único grande meio de comunicação que ousou um pouco mais nas críticas ao governo Fernando Henrique Cardoso por este ter permitido uma crise que chegou a quebrar empresas e que infernizou por quase um ano a vida da população.

Os brasileiros começaram a saber que seriam submetidos a um racionamento draconiano de energia elétrica já em janeiro de 2000. A princípio, a imprensa se limitava a divulgar desmentidos do governo de que haveria tal racionamento.

Em 30 de janeiro 2000, um ano e meio antes do início do racionamento, a Folha publica matéria em que o então ministro de Minas e Energia, Rodolpho Tourinho, garantia ser inexistente o risco de racionamento. Apesar da escassa cobertura do assunto pela imprensa, nas poucas matérias que foram surgindo nos meses seguintes o governo sempre negava o problema.

Seis meses depois, em 3 de junho de 2000, um ano antes do início do racionamento, Antonio Ermírio de Moraes entregou a Deus a possibilidade de se evitar racionamento de energia elétrica no Brasil a partir do próximo ano. “Se São Pedro não for brasileiro, nós vamos passar mal. Só Deus evitará racionamento“.

Três dias depois (06/06/2000), o ministro de Minas e Energia do governo tucano volta a negar o racionamento.

Até o fim daquele ano, a Folha só publicou sete matérias sobre o racionamento que ia se tornando cada vez mais inevitável. Em 19 de janeiro de 2001, ano em que seria decretado o racionamento, o jornal finalmente toca no assunto racionamento. Só que na… Califórnia.

Nos dias 20, 24, 27 de janeiro e em 17 de fevereiro, o racionamento de energia no estado norte-americano da Califórnia volta a ser noticiado na Folha enquanto o segundo maior país das Américas se preparava para mergulhar no maior racionamento de energia de sua história.

Em 3 de março de 2001, do nada, o jornal paulista sai na frente do resto da imprensa, que evitava o assunto, e, em matéria discreta que não ganhou nem chamada na primeira página, diz, em bom tucanês, que, “Se não chover em março, já a partir de maio é possível que o governo seja obrigado a adotar um controle no consumo de energia.

Dez dias depois, a Folha volta a culpar São Pedro pelo apagão que até as rotativas do jornal sabiam que sobreviria. Em 13 de março de 2001, três meses antes do início do racionamento, o jornal paulista anuncia, ainda de forma discreta, sem chamada na primeira página, que “Falta de chuva já é preocupante”.

No dia seguinte (14/03/2001), a dois meses e meio do racionamento, o apagão virá boa notícia na Folha: “Poupar luz dará prêmio”. Vale a pena ler este trecho da matéria:

O novo ministro de Minas e Energia, José Jorge, disse ontem que o governo adotará medidas de “racionalização” e não de “racionamento” para evitar o risco de falta de energia elétrica.

Essa possibilidade existe porque o nível dos reservatórios de água das hidroelétricas das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste está baixo. O objetivo da racionalização, de acordo com o ministro, é diminuir o consumo no horário de maior demanda.

De acordo com José Jorge, “racionamento é uma medida unilateral” que ainda não está sendo estudada. Já na racionalização, segundo o ministro, poderá haver incentivo para que os consumidores residenciais diminuam o consumo (…)”

Mais 3 dias e o racionamento, sempre longe da primeira página, já vai ganhando contornos de realidade. Detalhes de medida que não haveria vão sendo enfiados pela goela do consumidor. Em 16 de março, o jornal anuncia que “Iluminação pública e residências seriam atingidas por racionamento estudado”.

O único racionamento chamado pelo nome que ganha as páginas da Folha é o da Califórnia. Em 20 de março, a cerca de dois meses do racionamento verde-amarelo, o jornal divulga que “Racionamento volta a atingir” um estado da superpotência, o que parece sugerir que se acontece por “lá”, não haveria nada de mais se acontecesse por aqui.

No mesmo dia, ainda sem usar a palavra racionamento, a Folha diz que “Consumo de energia pode ter corte em maio”. Até então, o assunto jamais ganhara a primeira página.

Finalmente, em 22 de março de 2001, o jornal paulista reconhece, em editorial, que pode haver racionamento de energia do Brasil e faz uma espécie de crítica, ainda que com as devidas concessões à culpa de São Pedro. Sempre longe da primeira página.

Em 4 de abril de 2001, a menos de dois meses do início do racionamento, o jornal já utiliza o termo que define o que irá acontecer, mas continua se atendo aos esforços do governo para evitar que haja racionamento. Não há críticas, mas matérias sóbrias e técnicas, cheias de eufemismos.

No dia seguinte, o termo racionamento finalmente é substituído por “apagão” e a Folha anuncia que depois da Páscoa o Brasil será obrigado a economizar energia compulsoriamente. Mas o foco da matéria é na campanha publicitária “educativa” que o governo desencadeará, então, para que o consumidor faça a sua parte.

No dia 7 de abril de 2001, mais um editorial sem críticas que se limita a analisar a situação e a reconhecer que o racionamento é iminente. As palavras incompetência, imprevidência e as necessárias menções a falta de investimento não aparecem nem uma vez.

Em 12 de abril, a cerca de um mês e meio do racionamento, finalmente uma crítica na página de opinião. Carlos Heitor Cony escreve uma crônica ironizando a “modernidade” que FHC e a mídia diziam que o país alcançara no governo tucano, sob o título “Bela modernidade”. No mesmo dia, outra coluna culpa Antonio Carlos Magalhães – e não FHC – pelo problema.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Segurança


O controle do Complexo do Alemão é um exemplo de integração policial

A Vila Cruzeiro passará a ser território de cidadãos
Estão na Vila Cruzeiro e na entrada do Alemão, neste momento, carros anfíbios da Marinha, Caveirões da polícia do Rio, Fuzileiros Navais, policiais federais, policiais civis e militares do Rio, soldados do Exército e, imagina-se, um contingente de agentes de inteligência das diversas forças.A tomada de controle do Complexo do Alemão demonstra muito mais do que a eficácia de uma política centrada na construção de Unidades Policiais Pacificadoras.O tráfico fugiu das UPPs, reagiu e passou a ser combatido de forma maciça.O governador Sérgio Cabral e o secretário de Segurança José Maria Beltrame conseguiram, primeiro, integrar as polícias do Rio.Não é coisa fácil.O amigo navegante se lembra das cenas de guerra civil em frente ao Palácio do Padim Pade Cerra que se transformaram as divergências entre as polícias Civil e Militar da Chuíça (*).O segundo trabalho político de Cabral e Beltrame foi criar as condições morais e técnicas para ter direito à participação de contingentes da Marinha e Exército.O tráfico não vai acabar.Sempre haverá o consumidor.Mas, quando os policiais do Rio de Janeiro cruzaram as ruas estreitas da Vila Cruzeiro e, enfim, chegaram ao topo do morro, ficou estabelecido que o cidadão tinha recuperado uma boa parte de seus direitos.Direito à Educação, à Saúde, ao Comércio e à Paz.Quando o secretário Beltrame começou a ofensiva para re-instalar o poder do Estado nas favelas do Rio, a classe média, os ricos, e as Organizações (?) Globo ficaram contra.Com o argumento hipócrita de que haveria sangue e abusos, escondiam um outro temor, mais profundo.O temor de que as favelas se tornassem bairros em que cidadãos pobres pudessem viver com dignidade.E o que a classe média, os ricos e as Organizações (?) Globo mais queriam e querem é a Sowetização do Rio e do Brasil.O que eles querem é o Carlos Lacerda.Cabral e Beltrame fizeram o funeral do Lacerda no alto da Vila Cruzeiro.Aleluia !
Paulo Henrique AmorimDo Blog CONVERSA AFIADA.

Educação

Por quê o PIG não gosta do ENEM?
Por Paulo Henrique Amorim
Amiga navegante, mãe de um jovem que se prepara para fazer o ENEM, telefona indignada: por que o PiG (*) é contra o ENEM ?E, enfática, pergunta: se o ENEM é essa porcaria que eles dizem, por que o “seu” Di Gênio todo dia compra páginas inteiras dos jornais de São Paulo – Folha (**), pág. A9 – para dizer que o colégio dele, o Objetivo Para Gênios Superiores, é o melhor do ENEM ?Esquisito, não, amigo navegante ?Depois de uma prova do ENEM ter sumido de dentro de uma gráfica da Folha (**), agora o Estadão e a Folha (**), na primeira página, parecem alarmados com o vazamento de dados de candidatos do ENEM, que só deveriam ser acessados por portadores de senhas autorizadas.O próprio Estadão diz que a fonte foram “técnicos” de escolas de São Paulo.Uma hipótese é que aqueles com acesso tenham aberto as portas a todos.São Paulo (o Governo tucano de São Paulo, bem entendido) não gosta do ENEM.No primeiro vazamento, as universidades públicas de São Paulo foram as primeiras a dizer que não queriam esperar pela segunda prova do ENEM.Interessava ao Governo tucano de São Paulo – como interessa agora – desmoralizar o excelente Ministro da Educação, Fernando Haddad.Não se trata, apenas, de uma questão pessoal, embora o Ministro da Educação dos tucanos de São Paulo, Paulo Renato de Souza, tenha bons motivos para não gostar da nova gestão (***).É uma questão política.E quem já percebeu foi o Di Gênio, o Espírito Santo de Orelha do Ministério da Privatização da Educação dos tucanos.O ENEM veio para ficar.O ENEM acabou com o cursinho pré-vestibular (como o Objetivo).O ENEM vai democratizar a educação superior.O estudante de Itacoatiara, no Amazonas, se tiver um bom ENEM, pode vir estudar no ITA.Um estudante de Itaquaquecetuba, São Paulo, se tiver um bom ENEM, pode ir estudar na excelente Universidade Federal de Pernambuco.Não precisa fazer cursinho.Nem se deslocar para o local onde quer estudar.Ou seja, os pobres vão poder estudar nas universidades boas.Não na USP, que já foi boa (clique aqui para ler “Tucanos rebaixam a nota da USP”).O ENEM (além do ProUni) vai ajudar o bom aluno negro, o bom aluno pobre.E isso para a elite branca e separatista de São Paulo é um horror !Horror !É a pior elite do mundo, segundo o Mino Carta.O Di Gênio percebeu isso antes do PiG e está furioso, porque sua escola avançada para cérebros superiores não se classificou no ENEM.O negócio do Di Gênio passa a ser o ENEM, porque ele viu que não adianta chorar.Era bom o Di Gênio ter uma conversinha com o pessoal do PiG (*).Em tempo: pior que o Estadão e a Folha é o Globo, que acaba de me chegar às mãos. Diz a manchete da primeira página: “Enem vira caso de policia e pode acabar na Justiça”. O caso de polícia é uma aluna de Salvador que quer anular o teste. Se todo aluno insatisfeito com uma prova merecesse manchete do Globo … O Globo também diz que a Ordem dos Advogados do Brasil considerou as falhas um “desastre” e anunciou que vai pedir ao Ministério Público Federal que apure o caso. Que a OAB se tornou o braço desarmado do PiG não há mais duvida. Agora, nem a reportagem do Globo diz onde a OAB vai ao MPF. O Globo deve estar muito aflito com a Ley de Medios. Abandonou a lua de mel na hora de fazer o check in no hotel. Nem subiu o elevador.